Coggiola: governo usa burocracia sindical para retirar direitos
Publicada em
23/01/15 18h48m
Atualizada em
23/01/15 18h58m
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Historiador e professor da USP diz que Brasil pós-eleições é o do conflito social
Quando, no final do ano passado, cinco centrais sindicais levaram ao governo uma proposta que permitia reduzir o salário dos trabalhadores em até 30%, com redução da jornada de trabalho, escancarava-se um dos principais meios utilizados para legitimar a retirada de direitos: a burocracia sindical, expressa principalmente no atrelamento da maior central sindical do país, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), ao governo federal. A avaliação é do historiador e professor da USP, Osvaldo Coggiola, que, ao olhar para o pleito eleitoral de 2014, não vê a dualidade que então fora agitada. Para ele, resumiu-se a uma disputa entre os setores dominantes. “O empresariado fez mais doações à campanha pela reeleição de Dilma Rousseff (R$ 300 milhões) do que à do governador mineiro Aécio Neves”, observa Coggiola em seu texto ‘o Reajuste do Ajuste Brasileiro’.
O duro investimento dos empresários na campanha de Dilma poderia ser explicado, para ele, pela ação combinada de repressão estatal com cooptação de entidades de classe e movimentos sociais, exercida pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Por ter como centro a disputa entre dois partidos da ordem, a eleição presidencial, na avaliação de Coggiola, não expressou as revoltas populares que estouraram no país ao longo de 2013, e o que ele denominou de ‘grande volatilidade pré-eleitoral’ seria um forte indício da desconfiança dos trabalhadores frente às principais candidaturas apresentadas.
Para seguir orquestrando sua política, o governo estaria escancarando um leque de alianças extremamente nocivo aos trabalhadores. Como exemplo, o docente cita a nomeação do novo gabinete de Dilma, com destaque para o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que, como lembra Coggiola, atuou na função de estrategista econômico no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), tendo tido envolvimento na privatização de empresas públicas e na liberalização do sistema financeiro.
“A prioridade anunciada por Levy é a de cortar e retalhar investimentos públicos, pensões, pagamentos por desemprego e salários do setor público, Mas ele não inventou essa política, apenas lhe dá uma continuidade ‘radical’. No Legislativo, estão desde 2014 na agenda projetos de criação de fundações públicas de direito privado (desmonte do setor público), de limitação do investimento público com pessoal e de demissão por ‘insuficiência de desempenho’. Sob o pretexto de ‘estabilizar a economia’ (para os grupos financeiros), Levy desestabiliza a economia de dezenas de milhões de trabalhadores”, afirma Coggiola. O texto do professor da USP pode ser lido na íntegra no anexo ao fim desta página.
Recentemente, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, Levy afirmou que direito a ‘seguro-desemprego’ é totalmente ultrapassado. A partir de março, novas regras para a obtenção deste direito devem começar a valer. Então, segundo cálculo do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), mais de dois milhões de trabalhadores podem deixar de ter acesso à garantia.
Brasil continua desigual
Desmitificando a propaganda governamental de que a desigualdade social vem diminuindo no Brasil, Coggiola traz dados que apontam para o contrário. Para isso, cita pesquisa efetivada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) da UnB, que cruzou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e das declarações de Imposto de Renda de Pessoas Físicas. O estudo concluiu, conforme mostra o docente, que os 50% mais pobres da população brasileira detêm apenas 10% da renda. Se considerados os 90% mais pobres, vê-se que estes detêm aproximadamente 40% da renda.
“Isto significa que os 10% ‘mais ricos’ da população detêm 60% dos ingressos, e se avançarmos até o topo, verifica-se que 0,5% da população detêm 20% da renda nacional. Contrariando toda a propaganda dos governos petistas, aceita tanto pela ‘oposição de direita’ como pela ‘esquerda’, a desigualdade social se manteve estável durante a era Lula-Dilma, apresentando ligeira tendência a aumentar”, observa Coggiola.
Fim de um ciclo
Alguns dados sinalizam, para Coggiola, que o Brasil chega ao fim de um ciclo. As mobilizações de trabalhadores e da juventude brasileira neste início de 2015 colocariam essa perspectiva na ordem do dia. Como exemplos, ele cita a greve encampada pelos trabalhadores da Volkswagen e os protestos que começam a surgir em torno do transporte coletivo.
“As greves, que entre 2003 e 2005 oscilaram em torno do número de 300 anuais (compreendendo entre 15 e 20 mil horas paradas por ano) pularam em 2012 para 873 anuais, com quase 87 mil horas paradas (segundo medições do Dieese)”, aponta o docente.
Para ele, o 2º Congresso Nacional da CSP-Conlutas, a ser realizado entre os dias quatro e sete de junho deste ano, ilustra um espaço importante de articulação frente às investidas que os trabalhadores vêm sofrendo.
Texto: Bruna Homrich
Imagem: Google
Assessoria de Imprensa da SEDUFSM
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- O reajuste do ajuste, por Osvaldo Coggiola