Entidades divulgam “Carta de São José do Norte”
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Atualizada em
20/12/18 15h16m
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Documento afirma que empreendimentos de mineração são “projetos de morte”
As entidades organizadoras e também as que participaram e apoiaram a realização do II Seminário Regional sobre os impactos dos projetos de mineração e o I Encontro sobre os impactos dos projetos de mineração, divulgaram a “Carta de São José do Norte”. O documento sintetiza os principais apontamentos tematizados nesses eventos, que ocorreram nos dias 13 e 14 de dezembro em Rio Grande (Auditório do HU da Furg) e em 15 de dezembro, em São José do Norte. As atividades foram organizadas pelo Grupo de Trabalho de Políticas Agrárias, Urbanas e Ambientais (GTPAUA) do ANDES-SN, pela Secretaria Regional RS do ANDES-SN, e pelas seções sindicais do ANDES-SN no estado (Aprofurg, Sedufsm, Adufpel, Sesunipampa, SindoIF e seção sindical da UFRGS).
Dentre os destaques que constam da Carta, as considerações de que os empreendimentos envolvendo a exploração através da mineração, na realidade são verdadeiros “projetos de morte”. Também afirma o documento que é fundamental que o debate a respeito da implementação de 160 projetos de mineração no RS seja ampliado, especialmente com as comunidades diretamente atingidas, que precisam ser consultadas. Na avaliação dos participantes do seminário e do encontro, as audiências públicas são insuficientes enquanto ferramenta de participação dessas populações.
Acompanhe a íntegra do documento a seguir:
“CARTA DE SÃO JOSÉ DO NORTE
Nos dias 13, 14 e 15 de dezembro de 2018 ocorreu o “I Encontro sobre os impactos da mineração nos(as) pescadores(as) artesanais” e o “II Seminário Regional sobre os Impactos dos Projetos de Mineração: O que sabemos? Para onde vamos?”. Nos eventos estiveram presentes membros de comunidades pesqueiras e agricultores familiares locais, movimentos sociais, pesquisadores(as) e estudantes em âmbito nacional, regional e local. Promoveram-se debates que dialogam com aspectos da mineração e seus impactos, desde questões de ordem política e decisória, questões relativas à extração, transporte e armazenamento dos minérios. Sendo assim, foi possível extrair diversas conclusões, dentre as quais se destacam:
• Considerando a intenção de mais de 160 projetos de mineração para a metade sul do Rio Grande do Sul, torna-se clara a necessidade de ampliação dos debates em âmbito político, social, jurídico e acadêmico sobre o tema em todo o território afetado;
• É necessário consultar as comunidades antes de formular os projetos de desenvolvimento para o território, superando a restrição dos debates apenas às audiências públicas. Para o setor da mineração, as decisões são restritas às instâncias políticas de alto escalão de modo exclusivamente vertical. Dessa forma, demarca-se a necessidade de consulta prévia, livre, bem informada, culturalmente adequada e de boa fé, conforme a OIT 169 e demais regramentos sobre povos tradicionais;
• As consultas, restritas ao licenciamento ambiental, apresentam profunda carência de informações compreensíveis para as comunidades, pelo desrespeito à linguagem e tempo necessário para elas terem clareza sobre os reais impactos. Além disso, não são viabilizadas as condições para comparecimento e efetiva participação popular nos debates;
• Não se considera a sinergia ou cumulatividade dos impactos da mineração com demais empreendimentos (minerários ou não) que tem cada vez mais ameaçado a reprodução dos modos de vida e oprimido as populações tradicionais que tem sua cultura e identidade vinculadas aos territórios;
• A criação de unidades de conservação como mecanismo de minimização, mitigação e compensação dos impactos das atividades poluentes, como a própria mineração, acabam retirando moradores de seu território ou inviabilizando suas atividades. Sendo assim, a criação das unidades, nos casos em destaque, acabam se constituindo também em um impacto sobre as comunidades tradicionais e do campo.
• Os projetos de mineração são justificados para geração de emprego, arrecadação tributária e crescimento econômico. Entretanto, as experiências concretas demonstram que os projetos têm servido apenas para o desenvolvimento econômico de grandes grupos de interesse, em detrimento da qualidade de vida da maior parte da população (baixa empregabilidade, péssimas condições de trabalho, insalubridade, violência, degradação social e graves passivos sobre o ambiente natural), além da baixa arrecadação tributária, que não permite a promoção de políticas públicas voltadas ao combate dos problemas criados pelo próprio empreendimento;
• Diante das constatações mencionadas, os projetos de mineração representam um “projeto de morte”, conforme sustentam pescadores artesanais, agricultores e pecuaristas familiares, ribeirinhos, quilombolas, caiçaras, indígenas e comunidade em geral.
• Há profunda fragilidade dos estudos ambientais, no âmbito do licenciamento ambiental, que não apresentam com clareza (ou sequer apresentam) planos de recuperação de áreas degradadas, ou mesmo a recuperação das estruturas sociais impactadas. Aliás, os impactos sociais são profundamente negligenciados, restritos a indicadores de aumento de PIB e geração de empregos, desconsiderando os constrangimentos e desqualificação dos modos de vida, bem como alterações na cadeia produtiva de atividades locais;
• As regiões afetadas apresentam profunda fragilidade socioambiental, sendo consideradas áreas de extrema relevância para conservação pelo Ministério do Meio Ambiente e UNESCO. Contudo, passam a ser consideradas áreas de sacrifício que levariam a uma concentração de atividades poluidoras e destruição de suas principais características e potencialidades;
• Por fim, tendo em vista a unanimidade de posicionamentos contrários à mineração em São José do Norte, Lavras do Sul e Caçapava do Sul, faz-se necessária a revisão imediata dos processos de licenciamento ambiental, bem como dos planos nacional e estadual de mineração, a fim de contemplar a demanda popular e garantir a soberania dos povos tradicionais sobre seus territórios, fundamentos do Estado Democrático de Direito.
Estreito, São José do Norte, 15 de dezembro de 2018.
Assinam:
MPP Nacional
MPP Articulação Sul-Sudeste
MAM
APROFURG
Regional RS do ANDES-SN
SEDUFSM
ADUFPeL
NUPAUB/USP
Fórum da Lagoa dos Patos
GAPTA/UFPA
Amigos da Terra
UPP Camaquã
OPEAR
ANP
Laboratório MARéSS/FURG
Fórum Delta do Jacuí, Lago Guaíba e Norte da Laguna dos Patos
Observatório de Conflitos Ambientais e Urbanos do Extremo Sul/FURG.”
Texto: Fritz R. Nunes
Fotos: Fritz R. Nunes e Liana Nunes Coll (Adufpel)
Assessoria de imprensa da Sedufsm