Caso Kiss: descumprimento da lei e falta de fiscalização, destaca advogada SVG: calendario Publicada em
SVG: atualizacao Atualizada em 28/01/19 22h16m
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Tâmara Soares, autora da petição à Comissão Internacional, enfatiza responsabilidade municipal

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Tâmara Biolo Soares analisou toda a documentação relativa ao caso Kiss

O incêndio na Boate Kiss completou seis anos de “impunidade pública”. A constatação é da advogada Tâmara Biolo Soares, que atua em Porto Alegre, junto ao Instituto de Prevenção à Violência, e uma das autoras da petição à Corte Interamericana de Direitos Humanos, junto com a Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), pedindo a responsabilização do Estado brasileiro.

O documento foi encaminhado em janeiro de 2017 e pode ainda tramitar mais três ou quatro anos até que haja um posicionamento da corte. Tâmara esteve em Santa Maria no sábado, 26 de janeiro, no seminário sobre prevenção de tragédias evitáveis, que ocorreu durante toda a tarde de sábado, no Auditório Wilson Aita, no campus da UFSM, na programação de atividades relativas aos seis anos da tragédia. Participando da mesa sobre “Direitos Humanos”, junto com a doutoranda em Direito Internacional pela USP e especialista em Direitos Humanos, Raquel Lima, a gaúcha e autora da petição destacou, mais uma vez, a responsabilidade dos órgãos públicos, em especial, a prefeitura de Santa Maria, pelo incêndio na casa noturna, em 27 de janeiro de 2013, que levou à morte de 242 pessoas e algumas centenas de feridos.

Usando uma espécie de gráfico, no qual foi montada uma “linha do tempo”, Tâmara Soares argumentou que prefeitura municipal à época, comandada por Cezar Schirmer, não aplicou a lei. Conforme a advogada, o Poder Executivo não foi apenas omisso, ele contribuiu para o fato trágico, tendo em vista que permitiu que as irregularidades da boate se mantivessem, devido a não fiscalização na forma que a lei prevê. Ela vai mais além: a prefeitura também não investigou para atribuir as devidas responsabilidades. Analisando toda a papelada da casa noturna, diz Tâmara, percebe-se que a Kiss, desde que começou a funcionar, em 31 de julho de 2009, nunca esteve aberta com todos os documentos válidos ao mesmo tempo, conforme o estabelecido na legislação.

Mas a questão não se resume à prefeitura municipal. O caso do Ministério Público (MP) também é relevante, na análise dela. Tâmara afirma que a boate cometia crime ambiental, devido ao excesso de ruído, mas o MP não foi rigoroso na sua fiscalização. Além disso, era de se esperar que houvesse investigação dos promotores que atuaram no caso da boate, mas isso não foi feito, ressaltou a advogada. Portanto, disse ela, o que a denúncia do caso Kiss à Corte Interamericana busca é “verdade, justiça e reparação”.

Para a advogada, as falhas envolvem os dois entes públicos citados e mais o Corpo de Bombeiros. Um dos erros cometidos pela corporação, disse ela, é que tenham permitido que civis, leigos, tenham arriscado a vida (e alguns morreram) entrando no prédio da boate, tentando socorrer/retirar outras pessoas. Sendo assim, todos esses apontamentos em relação à tragédia, estão no processo encaminhado à Corte Internacional.

Elite encastelada

Para Tâmara Soares, o caso da boate Kiss chama atenção para alguns aspectos que a sociedade precisa atentar. Segundo ela, é notório o “déficit democrático” do Ministério Público e das instituições que compõem o sistema judiciário. É preciso discutir algum tipo de controle a segmentos que, no entendimento dela, funcionam como uma “elite encastelada”. Não é admissível, por exemplo, que o MP decida não processar o prefeito pela tragédia, e que ninguém mais possa contestar isso. Em outros países, como nos Estados Unidos, entidades particulares, como a própria AVTSM, poderiam ingressar com um processo contra o chefe do Executivo, caso desejassem.

Leis obsoletas

A advogada destaca que é justamente a legislação ultrapassada, como a de improbidade administrativa, que não permite que, por exemplo, uma entidade privada processe a autoridade. Tâmara cita também a questão dos códigos de posturas dos municípios que, segundo ela, estão obsoletos. Ela sugeriu que a AVTSM encaminhe solicitações às capitais dos estados, pedindo informações sobre os códigos de posturas. Outra constatação técnica dela é que inexiste no país uma organização nacional de prevenção de incêndios. Para a advogada, a Associação de Familiares e Sobreviventes de Santa Maria, que ela considera um exemplo enquanto entidade ativa em nosso país, poderia se tornar uma referência em termos de atuação em prevenção de tragédias.

Silêncio e impunidade

O silêncio premia a impunidade, afirmou Daniela Arbex. Ela participou da segunda mesa da tarde de sábado, cujo tema foi o ‘papel e a importância da imprensa nas tragédias’. Participaram das discussões, além de Daniela, autora do livro “Todo dia a mesma noite”, cuja primeira publicação foi em janeiro de 2018, Marcelo Canellas, repórter do Fantástico da Rede Globo, profissional que tem vínculos familiares e profissionais com Santa Maria. A coordenação da mesa ficou a cargo de Eloi Zorzetto, da RBS TV em Porto Alegre.

Citando referências da advogada Tâmara Soares, Daniela reforçou que “a palavra do outro é uma arma poderosa contra o esquecimento”. E esse, segundo ela, foi um dos objetivos pelo qual escreveu o livro, resultado de pesquisas e entrevistas iniciadas ainda em 2016, aqui na cidade. “A história foi contada para mostrar que o que aconteceu em Santa Maria pode acontecer em qualquer outro lugar”, frisou a jornalista.

Lembrar e homenagear

Saudando o trabalho “aguerrido” de Daniela Arbex, o jornalista Marcelo Canellas problematizou as possíveis lições aprendidas com a tragédia. “Os jovens foram as grandes vítimas da Kiss. Por que Santa Maria não faz um projeto cultural articulado, buscando atingir os jovens”, questionou fazendo a citação ao prefeito de Santa Maria, Jorge Pozzobom (PSDB), que estava no local do debate, na UFSM.

Para fortalecer seus argumentos e questionamentos, Canellas relatou diálogos com dois estrangeiros que estiveram em Santa Maria anos atrás: um colombiano de Medellín (cidade que nos anos 80 era exemplo de violência devido ao narcotráfico) e outro de Bilbao, na Espanha, cidade que sofria com os enfrentamentos entre as ações de Terrorismo do ETA e o governo espanhol. Em ambos os casos, os problemas que aprisionavam essas cidades foram superados.

Nos diálogos, o colombiano e o espanhol ponderaram algumas questões a partir da tragédia da Kiss. Uma delas, que Santa Maria deveria se tornar um exemplo em termos de prevenção e segurança. No entanto, questionou Canellas, o que avançamos nesses aspectos?

Um outro ponto de vista a ser considerado, conforme o jornalista, é falar sobre o assunto para que ele não caia no esquecimento. “Devemos não apenas lembrar, mas também homenagear as vítimas”, disse Canellas. A ideia tem que ser sempre aprender com as más experiências, disse ele, aproveitando para lembrar do fato recente, que era o rompimento da barragem da empresa Vale do Rio Doce, em Brumadinho, em Minas Gerais, pouco mais de três anos após tragédia semelhante ocorrida em Mariana, também no território mineiro. Em situações como essas, tragédias, o repórter defende que não há como ser “neutro” ou “imparcial”. Infelizmente, no entendimento dele, em boa parte dessas tragédias, o que está por trás são interesses econômicos, visões gananciosas.

Fotos e revista científica

Os seis anos da tragédia da Kiss também foram marcados por uma vigília e pela cavalgada da paz, na noite de sábado, 26. Já no domingo, 27, as atividades ocorreram mais ao final da tarde, no entorno da praça Saldanha Marinho, no centro da cidade. Um dos destaques foi a exposição fotográfica do professor Dartanhan Figueiredo, docente aposentado da UFSM, que ele mesmo intitulou de exposição fotográfica de protesto: “massacre anunciado”.

Com registros feitos por ele mesmo, que conseguiu entrar algumas vezes no espaço onde foi a casa noturna, o docente, que tem como uma de suas paixões a fotografia, argumenta, através das imagens, que o incêndio e suas consequências de 242 mortes e centenas de feridos, não foi uma fatalidade, mas um massacre que já podia ser prenunciado. “O local era uma ratoeira cheia de obstáculos e labirintos”, acusa Dartanhan.

Também na praça Saldanha Marinho, por volta de 18h, ocorreu o lançamento da revista científica da Comunicação Social. A publicação é uma compilação de artigos escritos por formandos que usaram o caso da boate Kiss como objeto de seus estudos. O lançamento foi feito pelo pró-reitor de Extensão, professor Flavi Lisboa, e pela professora do curso de Comunicação Social da UFSM, Ada Cristina Machado da Silveira.

(Mais fotos, logo abaixo, em anexo)

Texto: Fritz R. Nunes

Fotos: Fritz Nunes e Ivan Lautert

Assessoria de imprensa da Sedufsm

 

 

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