Arroubos autoritários no governo Bolsonaro preocupam, diz professor da UFSM SVG: calendario Publicada em 21/01/20 18h23m
SVG: atualizacao Atualizada em 21/01/20 18h33m
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Reginaldo Perez, cientista político, aborda temas como o discurso “moralizante” do Executivo

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Roberto Alvim, secretário nacional de Cultura, demitido semana passada após flertar com ideias nazistas

A queda da popularidade do governo de Jair Bolsonaro é fenômeno passageiro ou tende a se manter? Para o cientista político, Reginaldo Perez, professor do departamento de Ciências Sociais da UFSM, o declínio da popularidade é algo bastante frequente nos mais diferentes governos, no entanto, observa um detalhe particular do atual. Segundo ele, os setores chamados “bolsonaristas” seguem apoiando o Presidente, entretanto, detecta Perez, percebe-se um recuo dos segmentos identificados com o lavajatismo, ou seja, apoiadores do ex-juiz e atual ministro, Sérgio Moro, no apoio ao governo. Sobre o futuro, o professor da UFSM avalia que o processo das eleições municipais deste ano será importante para se tenha um desenho do quadro conjuntural- se o governo sairá fortalecido ou se a oposição é que ganhará musculatura.

Reginaldo Perez foi mais um dos analistas políticos a ser questionado pela assessoria de imprensa da Sedufsm a respeito destes pouco mais de 12 meses do governo Bolsonaro. No início de janeiro publicamos entrevista com os professores Cleber Martins e José Carlos Belieiro Júnior, da área de ciência política. Já nesta entrevista com Reginaldo Perez, foram questionados diversos temas, entre eles, um fato polêmico recente, que foi a manifestação semana passada, do então secretário nacional de Cultura, Roberto Alvim, em favor de uma “arte nacional”, usando como base o ministro da propaganda nazista, Joseph Goebbels. Depois de muita pressão, o membro do governo foi demitido, mas o fato acaba por dar razão aos setores que já acusam o governo Bolsonaro de flertar com posições autoritárias.

Na avaliação do professor de ciência política da UFSM, “os arroubos autoritários têm uma frequência preocupante na voz de alguns – não poucos – membros do governo Bolsonaro”. E complementou: “É possível que haja a intenção (de algumas figuras) de promover algo aproximado a uma institucionalidade de exceção. Mas o ponto fulcral é outro: seria o de se saber o quanto as instituições democráticas brasileiras podem suportar as provocações advindas de indivíduos e/ou grupos sociais e políticos supostamente interessados em desestabilizar a ordem democrática”.

Perez também analisou uma das bandeiras de campanha do governo Bolsonaro, que foi a da moralidade. Para o docente, apesar de o discurso moralizante estar sempre presente nas campanhas políticas, o pragmatismo de quando se é governo muitas vezes se impõe. No caso específico do atual governo, o cientista político ressalta que as dificuldades em manter esse discurso se ampliam a partir de situações como a investigação do filho do presidente, Flavio Bolsonaro, no caso da “rachadinha” na Assembleia Legislativa do Rio, bem como em relação ao caso “Queiroz”, através do qual se levantam suspeitas da existência de relações entre o clã Bolsonaro e os milicianos que atuam no Rio de Janeiro.

Na íntegra da entrevista que publicamos a seguir, o professor Reginaldo Perez faz observações sobre a mudança de rota do atual governo em relação a posições históricas do Brasil, de não alinhamento automática ao governo dos Estados Unidos, e ainda comenta sobre a divisão e a preponderância de setores no governo Bolsonaro, como por exemplo, a ala familiar, a ala ideológica e a ala militar. Confira a seguir.

Pergunta- O governo Bolsonaro encerrou seu primeiro ano com uma popularidade bem abaixo do que era nos primeiros dias de mandato. A que o sr. atribui esse desgaste e se isso é um fenômeno passageiro, ou se há um indicativo de que o governo Bolsonaro não almeja ser admirado pela maioria da população?

Resposta- O declínio da popularidade de governos no decorrer dos mandatos é algo bastante frequente. Mas creio que esse governo, em particular, conheceu um óbice em suas fileiras que está associado ao “lava-jatismo”. Os grupos mais mobilizados contra a corrupção – e que se identificam muito fortemente com o ministro Sergio Moro – dão sinais de recuo. Portanto, penso que, por ora, divorciaram-se os dois maiores grupos que elegeram Bolsonaro: há os “bolsonaristas”, que continuam apoiando o presidente; e há os apoiadores da Operação “Lava-jato”, que refluíram. A dúvida que permanece é o quanto esses dois grupos estão separados – e quais serão as consequências políticas desse divórcio. Há sinais de que o presidente está tentando manter a sua base de apoio com fins eleitorais, mas parece haver dificuldades em relação aos grupos mais identificados com a “luta anticorrupção”. Não me parece que esse fenômeno seja passageiro – ou seja, Bolsonaro provavelmente terá dificuldades de manter sua base de apoio nos níveis alcançados quando da eleição presidencial. Um dado importante a ser observado – para o exame da popularidade de Bolsonaro - é o desenho político do país que sairá das eleições municipais deste 2020: (i) se as esquerdas terão um desempenho razoável; (ii) mas, em especial, se o PT conseguirá recuperar parte de seu capital político de antes de 2016. Se as duas hipóteses se confirmarem, Bolsonaro poderia provocar nova polarização – à semelhança do que ocorreu em 2018 – em uma eventual (re)candidatura à presidência em 2022. 

Pergunta- O atual governo foi eleito com uma das bandeiras que era do combate à corrupção. Depois de episódios como o da investigação do filho, senador Flavio Bolsonaro, e da acusação (e investigação) a alguns membros de ministérios, que seguem em seus cargos, o sr. percebe como ficou esse discurso da moralização?

Resposta- O discurso de moralização tem, sobretudo, efeitos eleitorais em favor de seus proponentes. Quando no governo, o realismo – e o pragmatismo, que lhe é ínsito – findam por prevalecer. No entanto, há um fato em relação a esse governo que merece atenção: a conduta política de Flávio Bolsonaro quando deputado estadual no estado do Rio de Janeiro (o caso da “rachadinha”) que tem sido citada pela imprensa – e sobre a qual recaem as suspeitas. Temos aí uma situação de difícil desfecho, haja vista a conduta do MP do RJ, que parece desejar ir a fundo nas investigações. Não esqueçamos, também, das insinuações acerca de vínculos de membros da família Bolsonaro com milicianos – em especial, o “caso Queiroz” -, o que dificulta as coisas em termos de discurso moralizante.

Pergunta- Como o sr. vê essa constante postura do presidente Bolsonaro, e de alguns de seus auxiliares de linha de frente, de uma espécie de alinhamento incondicional ao presidente dos EUA, Donald Trump?

Resposta- Isso é, evidentemente, preocupante. O Brasil possui uma tradição digna no campo das relações internacionais e usufrui de um corpo diplomático altamente profissional – e poucas vezes em sua história alinhou-se automaticamente a outros governos. O que prevaleceu, em regra, na nossa política externa foi a independência e moderação nas posições adotadas. E essa tradição nos colocou – guardadas as devidas proporções – como um player respeitado no sistema internacional. Inclusive, esse histórico de prudência e comedimento favoreceu a nossa pauta exportadora: negociamos com “gregos” e “troianos” – demonstrando-se, com isso, que valores podem ser conciliados com interesses. 

Pergunta- Na sua avaliação, quem tem mais poder no atual governo: a ala ideológica; a ala familiar; ou a ala militar?

Resposta- Não sei responder. Mas creio que esses são, realmente, os grupos mais relevantes que se digladiam para exercer influência sobre o presidente e seu governo. Evidentemente, o grupo que lhe é mais próximo – e que lhe causa maiores problemas – é o familiar. De outra parte, os militares parecem conferir uma maior racionalidade às decisões – mas quanto a esse aspecto pouco se sabe. Por fim, a ala ideológica não auxilia muito – ao contrário – e não raro desorienta e dificulta a posição do governo brasileiro. Concluo afirmando que o que esse governo tem de forte, em meio a tantas infrequências, é uma política econômica de recorte liberal econômico capitaneada pelo ministro Paulo Guedes – que, não obstante todas as críticas sofridas nas outras áreas, possui amplo apoio do mercado e da mídia.   

Pergunta- Professor, na semana passada tivemos um episódio bastante grave em que, mais uma vez, o atual governo se viu enredado numa teia polêmica, com repercussões mundiais. Um secretário nacional de Cultura, que propôs uma “arte nacional” e usou referências do ministro da Propaganda da Alemanha nazista,  Joseph Goebbels. Com a sua experiência de três décadas trabalhando os temas da política, o que lhe parece esses arroubos de encantamento a vários tipos de regimes autoritários? Corremos o risco de uma escalada autoritária no país?

Resposta- É indiscutível a gravidade do fato que citas. Aliás, eu diria que o caso beira o inacreditável – tanto que a demissão da autoridade em questão se impôs de imediato. Os arroubos autoritários têm uma frequência preocupante na voz de alguns – não poucos – membros do governo Bolsonaro. É possível que haja a intenção (de algumas figuras) de promover algo aproximado a uma institucionalidade de exceção. Mas o ponto fulcral é outro: seria o de se saber o quanto as instituições democráticas brasileiras podem suportar as provocações advindas de indivíduos e/ou grupos sociais e políticos supostamente interessados em desestabilizar a ordem democrática. Com as nossas tradições (de feitio hegemonicamente autoritário), um dos fiéis da balança seriam as Forças Armadas – e, salvo engano, não me parece elas estejam dispostas a enfrentar essa aventura. Espera-se que as Forças Armadas brasileiras tenham aprendido com os erros políticos cometidos no passado.

 

Entrevista: Fritz R. Nunes

Fotos: Divulgação
Assessoria de imprensa da Sedufsm

 

 

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