Artigo de docente da UFSM sugere ações para reduzir desperdício de alimentos
Publicada em
28/07/20 15h29m
Atualizada em
28/07/20 16h13m
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Estudo estima que quantidade de alimentos desperdiçada anualmente supriria população desnutrida
Você já pensou sobre desperdício de alimentos? Quanto de comida vai fora anualmente? Quantas pessoas poderiam ser alimentadas caso houvesse uma racionalização maior do sistema de produção, circulação e consumo? Que medidas tomar para impedir que alimentos terminem no lixo? O artigo de autoria do professor Eduardo Botti Abbade, do departamento de Ciências Administrativas da UFSM, oferece importantes pistas para tais questionamentos. Publicado recentemente no jornal World Development, o estudo é intitulado “Estimando a perda nutricional e o potencial alimentar derivado das perdas alimentares em todo o mundo” e pode ser lido aqui.
No artigo, Abbade referencia-se no relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), que estimou a quantidade de alimentos perdidos em 2017. Segundo a estimativa feita pelo docente, cerca de 940 milhões de indivíduos adultos poderiam ter sido alimentados caso tal quantidade de alimentos não fosse desperdiçada. Considerando que há cerca de 785 milhões de pessoas em situação de desnutrição no mundo, os alimentos desperdiçados seriam mais que suficientes para tirar a população mundial da condição de desnutrição.
“Logo, uma das premissas centrais do estudo é a de que é necessário promover uma maior eficiência nos sistemas agroalimentares mundiais, além de promover um melhor alinhamento de abastecimento considerando demanda e suprimento em nível mundial”, reflete o docente.
Brasil
Nosso país estaria entre os que apresentam os mais elevados índices de desperdício alimentar, ao lado de Estados Unidos e China. Abbade explica que, embora o Brasil produza muito, também desperdiça muito, e as razões para tal fenômeno são de diversas ordens, desde questões estruturais até perfis comportamentais de consumo.
“Podemos enumerar algumas razões principais para isso, como uma infraestrutura logística ineficiente (estradas, portos, silos de armazenagem etc.), falta de planejamento nas unidades produtivas, regulação de preços inadequada (ex. preços que não cobrem os custos do produtor), intempéries mais severas agravadas pelas mudanças climáticas, problemas de armazenamento e acondicionamento dos alimentos em transporte, ausência de legislação que promova redução de desperdícios no setor de food services (restaurantes, lanchonetes etc.), geração de consumidores com o hábito ainda de "estocar" alimentos, comportamento de compra de horti-fruti com base na "beleza estética" dos alimentos, e inúmeras outras razões. Procurei enumerar algumas de modo a ilustrar que os problemas que agravam o elevado nível de desperdício estão distribuídos ao longo de toda a cadeia de suprimentos, desde o produtor até o consumidor final”, explica Abbade.
Alternativas
Mas o estudo não se contenta em estimar quantas pessoas poderiam sair da condição de desnutrição caso não houvesse desperdício de alimentos – ou este fosse reduzido drasticamente. O docente também aponta saídas para o problema, com a proposição de ações a serem implementadas nas várias etapas da cadeia de suprimentos. A intervenção do poder público é avaliada como central, especialmente a partir de políticas públicas de regulação de preços que tenham por objetivo proteger os produtores rurais sem onerar os consumidores, investimentos na infraestrutura logística e elaboração de normais mais eficazes para regulamentar o transporte e o armazenamento de alimentos.
Ao lado do setor público, Abbade avalia que o setor privado também tem seu papel a cumprir. “Temos exemplos no mundo de empresas do setor varejista e food service que conseguiram de forma muito inteligente combater os elevados níveis de desperdício de alimentos. Sempre gosto de citar o caso da rede de supermercados francesa "Intermarché" que, por meio de sua campanha "vegetais Inglórios", conseguir reduzir de forma muito positiva e exemplar os níveis de desperdício de alimentos na etapa de varejo. Basicamente se promoveu a venda de produtos considerados "feios" nas gôndolas dos supermercados a um preço significativamente inferior aos demais, além de utilizar tais alimentos para a produção de produtos alimentícios levemente processados (ex. molhos, sopas e vegetais já descascados e cortados)”, exemplifica o docente, acrescentando que o consumidor final também carrega uma responsabilidade importante na redução dos níveis de desperdício de alimentos, devendo “planejar melhor suas compras e organização doméstica para um consumo mais eficiente”.
Outra recomendação do artigo de Abbade é de que seja delineado um acordo internacional, semelhante ao que foi o protocolo de Kyoto, por exemplo, com o objetivo de engajar as nações em políticas de redução dos níveis de desperdício alimentar.
“É necessário promover um esclarecimento em nível mundial de que o desperdício alimentar não é apenas uma questão nutricional, mas uma questão de sustentabilidade e eficiência no uso de recursos naturais. Alimentos desperdiçados representam desperdício de uso de terra, água, dinheiro, trabalho humano, fertilizantes, defensivos agrícolas, emissões de Gases de Efeito Estufa, combustível, depreciação de máquinas e implementos agrícolas e inúmeros outros impactos”, conclui o docente.
O artigo, além de ser publicado em jornal internacional, rendeu a Abbade um convite para participar da 4ª Conferência Internacional sobre Segurança Alimentar, que ocorre ao fim deste ano em Montpellier, na França.
Texto: Bruna Homrich
Foto: Arquivo Pessoal
Assessoria de Imprensa da Sedufsm