Projetos na Câmara Federal querem sacrificar salário do funcionalismo
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Atualizada em
03/04/20 12h06m
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Deputados do PSDB e do Partido Novo usam pandemia para propor cortes que chegam a 50%
O pretexto para propor corte nos salários dos servidores dos Três Poderes parece simpático. Que cada um possa dar a sua colaboração no combate à pandemia do coronavírus, no momento em que a economia entra em recessão, e que muitos trabalhadores e trabalhadoras perdem seus empregos. Sendo assim, alguns parlamentares, que além de gordos subsídios, e diversos tipos de ajuda de custo, como auxílio moradia, entre outros, querem jogar nas costas de categorias como a dos servidores técnico-administrativos e docentes das instituições federais de ensino, mais uma das faturas da crise.
Já se tinha conhecimento do projeto do deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), que no último dia 24, protocolou o PL 1144/20, que prevê a redução salarial dos servidores públicos que recebem acima de R$ 5 mil, durante o estado de ‘calamidade’ decretado pelo governo federal. Entretanto, agora surgiu uma nova proposta, de autoria do deputado multimilionário, Alexis Fonteyne (Novo-SP), e subscrita por toda a bancada desse partido. O parlamentar apresentou duas emendas (de número 4 e 5) à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 10/2020, apelidada de “orçamento de guerra”. Através dessas proposições, Fonteyne sugere uma redução temporária no salário do funcionalismo que seria da seguinte forma:
- Redução de 26% sobre a remuneração bruta mensal entre R$ 6.101,07 e R$ 10.000,00;
- Redução de 30% sobre a remuneração bruta mensal entre R$ 10,000,01 e R$20.000,00;
- Redução de 50% sobre a remuneração bruta mensal a partir de R$ 20.000,01.
Assalto passa a ser legal
Conforme análise do Sindicato dos Servidores do Legislativo (Sindilegis), somando-se o confisco proposto pelo Partido Novo ao imposto de renda e contribuição previdenciária, o servidor seria assaltado pelo Estado em quase 70% da sua remuneração. Um assalto, que, neste caso, tentam transformar em constitucional.
Em relação ao projeto do deputado Carlos Sampaio, a proposição é de que haja uma redução de 10% para aqueles servidores que recebam acima de R$ 5 mil e até o limite de R$ 10 mil; e uma redução que varia de 20% a 50% para quem recebe acima de R$ 10 mil. Servidores das áreas de saúde e segurança pública estariam excluídos dos cortes. O parlamentar acrescenta também que os recursos confiscados dos servidores seriam direcionados ao Ministério da Saúde.
Inconstitucionalidade
O argumento do deputado tucano de que, em um momento de excepcionalidade, o preceito constitucional da irredutibilidade salarial poderia ser contornado é rechaçado de forma veemente pela professora Mariana Trotta, 1ª vice-presidente da Regional Rio de Janeiro do ANDES-SN, e encarregada de assuntos jurídicos da entidade.
Segundo Mariana, esse projeto “fere o artigo 37 da Constituição, que trata da vedação de redução de subsídios dos servidores públicos, ou seja, o princípio constitucional da irredutibilidade de salários, o que também é previsto no artigo 7º da Carta Magna para os trabalhadores da iniciativa privada. Essas são garantias constitucionais conquistadas no período da Assembleia Nacional Constituinte pela luta dos sindicatos e dos movimentos da classe trabalhadora organizados naquele período histórico. Não há excepcionalidade, porque a constituição não autoriza. A Constituição não abre essa brecha. Os trabalhadores e trabalhadoras, os servidores públicos, os professores e as professoras não podem ter seus salários reduzidos”, argumenta.
A diretora do Sindicato Nacional informa que o ANDES-SN está acompanhando a tramitação deste e de outros projetos semelhantes no Congresso Nacional, por meio de sua assessoria parlamentar, e vai atuar em todos os sentidos, na luta política e jurídica, para que essa violação dos direitos constitucionais das docentes e dos docentes não seja aprovada.
Reduzir salário pode piorar economia
Além dos aspectos legais, tendo em vista a afronta à Constituição Federal, reduzir salário pode piorar ainda mais uma economia já cambaleante. Analisando a proposta do Partido Novo para o jornal ‘O Tempo’ (Belo Horizonte), o professor de Direito Constitucional da Federal de Minas (UFMG), Thomas Rosa Bustamante alerta que a medida pode não trazer os efeitos desejados e agravar a crise econômica. “Isso pode gerar menos dinheiro circulando na economia, então, de repente, o cara vai deixar de pagar a faxineira a qual está pagando mesmo sem que ela realize o serviço, ou vai diminuir seu consumo. Pode vir a ser um remédio pior que a doença em um momento de economia estagnada”, analisa.
Alternativas na busca de recursos
Mas, diante da necessidade de recursos, qual a alternativa de fontes?
A diretora do ANDES-SN, Mariana Trotta, destaca que é essencial a revogação da Emenda Constitucional 95, para que sejam garantidos investimentos necessários para Saúde, Educação e ciência públicas, bem como demais políticas de assistência à população feitos investimentos.
Além disso, um plano emergencial popular para enfrentar esse momento de crise, com a aprovação, por exemplo, do Projeto de Lei Complementar 183/2019, em tramitação, que regulamenta o dispositivo constitucional para taxação das grandes fortunas. “Nós estamos em casa, como orienta a OMS, mas vigilantes e mobilizados de todas as formas possíveis nesse momento”, reforça.
Poderia ser acrescentado ainda à fala de Mariana a questão da suspensão do pagamento da dívida pública, que drena algo em torno de R$ 1 trilhão por ano ao sistema financeiro e credores privados. Isso aliviaria o orçamento de governos estaduais, municipais, e a própria União.
Sindicato pede pressão
Nesta quinta, durante a primeira votação da PEC 10/2020, foram realizadas inúmeras emendas, entre elas, as emendas 4 e 5, propostas pelo Partido Novo que propõem a redução salarial dos servidores públicos de todas as esferas: federal, estadual e municipal. A PEC 10/2020 será novamente votada nesta sexta (3), no Congresso Nacional, submetida a dois turnos. Apesar do relator da PEC 10 ter rejeitado todas as emendas e de Rodrigo Maia e alguns líderes partidários terem afirmado que nenhuma emenda será votada, não podemos confiar nesse Congresso. Por isso, O ANDES-SN pede que que seja feita pressão nos parlamentares de cada estado. A grande maioria está votando online, de suas casas ou escritórios estaduais.
Texto: Fritz R. Nunes com informações do Sindilegis, ANDES-SN e ‘O Tempo’.
Imagens: EBC, ANDES-SN, facebook e twitter
Assessoria de imprensa da Sedufsm