O ensino remoto sob a visão de docentes e estudantes surdos e surdas SVG: calendario Publicada em
SVG: atualizacao Atualizada em 26/04/21 12h00m
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Lei de Libras completa 19 anos neste sábado, 24

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No dia 24 de abril de 2002, foi oficializada a lei de Libras no Brasil. E tanto a data quanto o documento guardam uma importância especial para a comunidade surda. Ali estão previstos, por exemplo, os concursos aos surdos e surdas, a acessibilidade às universidades e órgãos públicos, e o ensino de libras nos cursos de licenciatura e fonoaudiologia. Quem explica um pouco sobre a importância da data é a professora Carilissa Dall’alba, docente de libras do departamento de Educação Especial da UFSM.

“A história da Educação de Surdos do Brasil começou em 1857 com a fundação da primeira escola para surdos do Brasil no Rio de Janeiro (a escola segue ativa nos dias atuais), de fato é uma história extensa e intensa. De muitas lutas, retrocessos e conquistas. Apesar de ser uma história de mais de 160 anos, a lei de Libras é recente e foi oficializada em 24 de abril de 2002”, conta a docente.

A Lei nº 10.436 reconhece a Libras como língua da comunidade surda. “A lei reforça o direito dos surdos de ter acesso a Libras. 24 de abril é uma data muito importante para ser comemorada e lembrada, pois tivemos muitos retrocessos e conquistas. Eu mesma pude me graduar em Letras/Libras que é o resultado da lei 10.436, com decreto 5.626 que regulamenta a lei 10.436. Fui da primeira turma de Letras/Libras com o polo UFSM, em 2006”, rememora Carilissa.

Educação bilíngue

Muitos avanços, contudo, ainda se fazem necessários no que se refere à educação para surdos e surdas no Brasil. Um deles, citado por Carilissa, é a questão da educação bilíngue. Ainda em 2020, o governo Bolsonaro lançou a nova Política Nacional de Educação Especial (Decreto nº 10.502/20), que foi revogada após críticas de entidades ligadas aos direitos das pessoas com deficiência. Carilissa defende que, antes da elaboração de um novo decreto, é necessário que se abra um diálogo com os profissionais e pesquisadores da área da Educação de Surdos. “O decreto 10.502 foi criado às pressas sem base de consulta de pesquisadores. O novo decreto recebeu vários repúdios e muitos pedidos de revogação”, explica.

Contudo, um artigo contido no decreto revogado poderia ser, na avaliação de Carilissa, incluído tanto na Lei de Diretrizes e Bases (LDB), quanto em uma Proposta de Emenda à Constituição que tratasse da educação bilíngue para surdos e surdas. O artigo em questão é seguinte:

“II - educação bilíngue de surdos - modalidade de educação escolar que promove a especificidade linguística e cultural dos educandos surdos, deficientes auditivos e surdocegos que optam pelo uso da Língua Brasileira de Sinais - Libras, por meio de recursos e de serviços educacionais especializados, disponíveis em escolas bilíngues de surdos e em classes bilíngues de surdos nas escolas regulares inclusivas, a partir da adoção da Libras como primeira língua e como língua de instrução, comunicação, interação e ensino, e da língua portuguesa na modalidade escrita como segunda língua; (BRASIL, 2020, s./p.)".

A docente acrescenta ainda que “a educação bilíngue de surdos, assim como a educação de comunidades indígenas em outras línguas, é uma questão que diz respeito às políticas linguísticas”.

Inclusão na UFSM

Desde 16 de março de 2020, a UFSM está com as atividades acadêmicas e administrativas presenciais suspensas em decorrência da pandemia. Logo após a suspensão já se instituiu, à época ainda sem normatização, o Regime de Exercícios Domiciliares Especiais (REDE), modelo de ensino remoto. Como vem sendo a adaptação de docentes e estudantes surdos e surdas a essas plataformas digitais?

Carilissa conta que aderiu ao REDE e que, no início, foi complexo, especialmente por ninguém saber que a situação ia se delongar por tanto tempo. Ainda hoje, mais familiarizada com o modelo, lecionar de forma remota tem sido um desafio.

“Me vi aprendendo as ferramentas para atender melhor os alunos via REDE, as aulas de Libras são por videoconferência porque Libras é língua visual necessita de olhar e participar a prática. Precisei aprender editar os vídeos, legendar e montar aulas no ambiente virtual. Fico muito feliz ver a evolução dos meus alunos nas aulas remotas, ensinar e aprender durante a pandemia realmente é um desafio sem tamanho. Quando os alunos aparecem na câmera é uma felicidade, eu entendo que nem todos conseguem ter acesso em casa para participar das aulas. Posso dizer que aprendo muito com alunos e nas aulas também. É um momento muito delicado e é necessário ter empatia, amor e compreensão nas aulas. Não é mesma coisa as aulas presenciais, mas tudo é possível quando há uma troca de compreensão, empatia e amor certamente o ensino torna de qualidade. É um desafio realmente dar aulas remotas”, compartilha Carilissa.

Claudia Sarturi, docente do departamento de Educação Especial da UFSM, também vem lecionando via REDE. Ela é responsável, desde março do ano passado, pela disciplina de Libras, ofertada a vários cursos da UFSM.

“Foi então quando começou a surgir a pandemia do Covid-19, comecei usar o home office utilizando as tecnologias adaptadas como plataforma via Moodle, Google Meet, gravação de vídeos produzidos em Libras. Os desafios são muito grandes como o trabalho remoto, as tarefas da casa e as atividades escolares da filha em casa. Entretanto, a rotina da casa não é tarefa fácil, por isso ficou ainda mais difícil com a pandemia. Porém, caso se ela não foi organizada, muitas coisas acabam sendo deixadas de lado e outras se acumulam, tornando o trabalho mais complicado posteriormente. Faz parte. Espero que o tempo passar, a pandemia irá acabar”, conta Claudia.

Marcos Felipe Pontes, 30 anos, é natural de Itapetininga (SP) e está no terceiro semestre do Curso Técnico em Enfermagem na UFSM. Ele vem acompanhando as aulas via REDE e destaca que a acessibilidade às atividades é garantida com a presença das intérpretes, mas que a experiência prática dos estágios tem feito falta.  

“Sim experiência sobre teoria estudo, mas difícil causa faltar prática visual também estágio importante aprender mais prática. Ótimo acessibilidade sempre live com interprete de libras nada problema. Preciso avançar é ‘prática’”, comenta o estudante.

Segundo Ravele Goularte, intérprete de libras e integrante do núcleo de acessibilidade da Coordenadoria de Ações Educacionais (CAED), a UFSM tem, no total, 19 estudantes e três professores (as) surdos (as). No segundo semestre do ano passado, 15 desses (as) estudantes haviam se matriculado para acompanhar as atividades letivas via REDE.

Ela conta que, imediatamente após a suspensão da presencialidade na instituição, os e as intérpretes contataram os estudantes surdos e surdas e se colocaram a disposição para o que eles (as) precisassem, especialmente para o acompanhamento online das atividades.

“A gente fez uma divisão em que cada intérprete acompanhou um ou dois alunos surdos, com a função de prestar algum serviço que eles precisassem durante a pandemia em relação à interpretação e tradução de libras para o português. Importante ressaltar que as pessoas surdas que utilizam a libras como primeira língua são sujeitos visuais, então muitos surdos têm relatado que estão sentindo certo enfraquecimento e esvaziamento em relação às aulas remotas, que eles preferem certamente o contato presencial do que esse contato através da tela”, conta Ravele, que vem dando suporte, junto a outros intérpretes, às aulas síncronas (ao vivo) e assíncronas (gravadas) oferecidas pelos (as) professores (as) via REDE. Quando há outras atividades acadêmicas além das aulas, os (as) profissionais também se colocam a disposição para contribuir no processo de mediação linguística.

“Uma demanda que a equipe de intérpretes da UFSM nunca tinha tido de forma tão grande é a gravação de vídeos. Tem muitos professores que colocam vídeos como materiais complementares em suas disciplinas, e na maioria das vezes esses vídeos não têm a tradução, então a gente grava e disponibiliza ao aluno surdo. Ou a gente grava e algumas colegas fazem a edição dos vídeos, colocando a janela de intérprete juntamente com o vídeo que o professor disponibilizou”, conta Ravele.

Mesmo com todo o empenho da equipe de intérpretes, de docentes e dos próprios estudantes, a pandemia trouxe uma série de desafios em termos de acessibilidade. Um dos entraves encontrados no modelo REDE é com relação à ferramenta utilizada para gravação das aulas.

“Por exemplo, muitas aulas vêm ocorrendo pelo Google Meet. Os professores gravam aulas e disponibilizam aos alunos, porém o Meet não grava a tela do intérprete, o que acaba dificultando porque, enquanto os alunos ouvintes podem retomar essa aula e assisti-la novamente, o surdo não tem essa possibilidade. Estamos estudando e pensando outras estratégias para cobrir essa demanda”, garante a intérprete.  

Avanços e limitações na UFSM

Carilissa, hoje docente, realizou seu Mestrado na UFSM entre os anos de 2011 e 2013, e conta sempre ter tido intérprete de libras em suas aulas.

“Tive acessibilidade respeitada durante a minha vida acadêmica. Com documentos legais (leis e decretos) importantes da Comunidade Surda, a Lei 10.436/2002 e o decreto 5.626/2005 começaram a repercutir a acessibilidade dos surdos nas universidades, principalmente as públicas. Me orgulho muito da UFSM por ser a pioneira a ter vestibular em Libras (na época que não tinha ENEM e SISU), vinham muitos surdos de fora para prestar vestibular na UFSM. A UFSM é referência nacional por ter um número de intérpretes de Libras, pois nas outras tem apenas duas ou três, aqui na UFSM tem mais de dez efetivos. Claro que mesmo com este número ainda não atende toda demanda da comunidade surda da UFSM, sempre é necessário organizar uma escala de horário para não deixar alguém sem acessibilidade, tudo é possível com o Núcleo de Acessibilidade”, comenta, com orgulho.

Apesar de a universidade ser uma referência nessa questão, ainda há o que ser alcançado. E as limitações vão desde o acesso ainda precário aos prédios da UFSM, até a falta de uma consciência coletiva no que se refere a incluir, em todos os eventos e materiais audiovisuais, a tradução de Libras. 

“O que precisa melhorar são os acessos em todos prédios da UFSM, ter mais funcionários com Libras e os próprios eventos chamar intérpretes de Libras, não nós surdos chamar. A responsabilidade de lembrar da acessibilidade devem ser os próprios eventos. Muitas vezes eu tive que pedir intérprete porque as comissões organizadoras não sabiam que precisavam chamar intérprete de Libras. Com a pandemia mundial por Covid a demanda de intérprete de Libras aumentou consideravelmente por causa das palestras, lives e reuniões onlines. É necessário sempre lembrar antes que a UFSM tem alunos e funcionários surdos. Eu gostaria de ver todos os vídeos da UFSM que estão nas redes sociais legendados ou com janela em Libras. Muitos vídeos estão sem legendas e sem Libras e eu não tenho como acessar. Mas na maior parte eu me sinto incluída pois há sim acessibilidade, qualquer falta eu procuro. Estou satisfeita com a acessibilidade do meu trabalho. Além da referência da acessibilidade que a UFSM tem, também tem a Educação Especial que é da referência nacional também. O meu departamento”, orgulha-se Carilissa.

Quem também partilha de análise semelhante é Claudia Sarturi, que destaca o vanguardismo da UFSM no que tange à acessibilidade via Libras.

“Falo da UFSM, foi uma das primeiras instituições que tem referência nacional trazendo intérpretes de libras e alunos surdos em diversos cursos de graduação e da pós-graduação e também professores surdos. Vejo a questão da acessibilidade dentro da UFSM que temos intérpretes de Libras são profissionais de qualidade e as demandas são grandes. É preciso avançar nas lutas pelo direito de acessibilidade aos surdos”, conclui a docente.

Acessibilidade no sindicato

A Sedufsm também vem adotando a Libras como ferramenta em suas atividades, passando a contar, em todas as suas lives, com um (a) intérprete que faz a tradução do conteúdo. 

 

Texto: Bruna Homrich

Imagem 1: Governo do RS

Imagens 2, 3 e 3: Arquivos Pessoais

Assessoria de Imprensa da Sedufsm

 

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