'Eles não usam black-tie’ e ‘Deus e o Diabo na terra do sol’ são a dica cultural SVG: calendario Publicada em 18/06/21 11h50m
SVG: atualizacao Atualizada em 18/06/21 12h03m
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Diorge Konrad e Alexandre Maccari homenageiam obras icônicas do cinema nacional

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Cena de 'Deus e o Diabo' na terra do sol', de Glauber Rocha

Sextou na quarentena! O Dia do cinema nacional é lembrado em duas datas: em 5 de novembro, mas também em 19 de junho, que será neste sábado. Para homenagear a data, o professor de História da UFSM, Diorge Alceno Konrad, e o historiador e servidor técnico da UFSM, Alexandre Maccari Ferreira, sugerem duas obras icônicas, respectivamente: ‘Eles não usam black-tie’ e ‘Deus e o Diabo na terra do sol’.

Em uma conjuntura em que a televisão, o cinema, são invadidos por obras estrangeiras, é importante lembrar que a história do cinema brasileiro é respeitada aqui, e também lá fora. Se recentemente tivemos ‘Bacurau’, aclamado internacionalmente, diversos filmes nacionais ao longo de décadas foram reverenciados mundialmente, como é o caso de ‘O pagador de promessas’, de Anselmo Duarte, Palma de Ouro no Festival de Cannes, em 1962.

Hoje, no entanto, ficamos com as indicações de Diorge Konrad e Alexandre Maccari, para as quais devemos tirar o chapéu e, especialmente, para quem não viu as obras, que o faça.

“Eles não usam black-tie

O liberalismo conservador achava que saíra vitorioso com o tiro no peito efetuado por Getúlio, em 24 de agosto de 1954. Estavam enganados. O suicídio do presidente da República não represaria a ascensão dos movimentos sociais daquela década e o início da seguinte, na qual o sindicalismo urbano e rural estimulava a consciência de jovens que se engajariam na luta estudantil, bem como nas artes e na cultura.

Foi dessa leva que nasceram tantos, como Gianfrancesco Guarnieri (1934-2006) e Leon Hirszman (1937-1987). O primeiro, no Teatro de Arena, com destaque para sua peça Eles não usam black-tie, encenada pela primeira vez em 1958; o segundo, no Cinema Novo, no roteiro e na direção de A pedreira de São Diogo, um dos filmes de Cinco vezes favela, produzido pelo Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional de Estudantes (UNE), em 1962.

Cinema e teatro engajados, numa época em que a cultura e educação popular estavam entranhadas na construção da consciência coletiva, produziram dois gênios da expressão artística brasileira. Eis que passados alguns anos da derrota política imposta pelo Golpe de 1964 e pela Ditadura, centrada no terrorismo de Estado que se aplacou  sobre o País, novas lufadas de resistência e de luta pela redemocratização, entre elas, do movimento operário, reuniram Guarnieri e Hirszman para produzir um dos melhores filmes brasileiros de todos os tempos.

Ao final da década de 1970, vinte anos depois da primeira versão da peça de Guarnieri, com a retomada das greves operárias, o cineasta, com uma ideia na cabeça e uma câmera na mão, rumou para o ABC paulista, impressionado com o que ali ocorria e de onde sairia seu clássico documentário ABC da greve, só finalizado após a morte de Leon Hirszman, diretor que defendia um cinema popular. Também foi ali que surgiu a convicção de que Eles não usam black-tie (imagem abaixo) poderia ser adaptada para o cinema e contextualizada para o Brasil de então.

Com Guarnieri, segundo ele, quem lhe ensinou “a colocar o povo em cena”,  escreveu o roteiro e os diálogos do filme homônimo a peça, mostrando a história do conflito familiar entre o pai, operário e sindicalista, Otávio, e o filho, Tião, também trabalhador, com aspiração de ascensão social e dividido com a gravidez de sua namorada, a igualmente proletária Maria, diante dos dilemas frente a uma greve sindical, a sobrevivência e a repressão político-policial. Com direção, roteiro e produção primorosos e elenco extraordinário, contando com atrizes e atores que vinham da luta por uma arte popular do pré-1964 e outros mais novos da resistência à Ditadura e de luta pela redemocratização, como o próprio Guarnieri, mais Fernanda Montenegro, Beth Mendes, Carlos Alberto Riccelli, Lélia Abramo, Francisco Milani, Milton Gonçalves, Renato Consorte, Rafael de Carvalho e tantos outros, o filme de 1981 foi indicado ao Leão de Ouro do Festival de Veneza e ganhou diversos prêmios, coroado por uma cena mágica do cinema nacional, ao final, quando os personagens de Guarnieri e Montenegro, o casal, dialoga e escolhe feijão para a refeição diária.

Eles não usam black-tie e seu autor, Guarnieri, foram homenageados justamente no Teatro de Arena Eugênio Kusnet, em São Paulo, em 18 de maio de 2000, com encenação de parte da peça por estudantes de artes cênicas da USP, além de trechos de seu primeiro filme como ator, O grande momento, dirigido por Roberto Santos. Na plateia e com falas (além de Guarnieri) ao final de Lélia Abramo, Renato Consorte, Antônio Cândido, José Renato (o diretor da primeira encenação). Quase inacreditável, né!? Sim, se eu não tivesse o privilégio de estar presente nesta noite histórica da vida social cultural brasileira (foto abaixo).

Foto (e): Denise Campão, Diorge Konrad, Guarnieri e Glaucia Konrad

Por tudo isto e muito mais, na Semana do Cinema Brasileiro, eu simplesmente indico: assistam o extraordinário Eles não usam black-tie, assim como recomendo os quatro boxes, produzidos pela Vídeo Filmes, com a obra de Hirszman, contendo este  filme, além de A pedreira de São Digo, Maioria absoluta (1964), A falecida (1965), São Bernardo (1972), Ecologia e Megalópolis (1973), Contos de trabalho (1974-6) e ABC da greve (1990), entre outros.”

Diorge Konrad

Professor do departamento de História da UFSM.

 

“O icônicoDeus e o Diabo na Terra do Sol’

Quando Deus e o Diabo na Terra do Sol foi lançado durante o Festival de Cannes em 1964, o Brasil já havia sido golpeado por forças civis-militares que afundaram o país em 21 anos de práticas de violenta repressão. A cultura brasileira, de uma forma geral, sofreu pela censura e pela perseguição de muitos artistas que contestavam o regime imposto. O cineasta Glauber Rocha fez do cinema sua voz e tornou ícone imagens de luta e de resistência.

Em seus filmes, Glauber (imagem abaixo) põe em xeque os valores estéticos cinematográficos, alimentando uma outra forma de construir visualmente o mundo. Ele estabelece uma ruptura do que se produzia até então, bradando pela originalidade do cinema brasileiro. O diretor, um dos integrantes mais reconhecidos do movimento ‘Cinema Novo’, inspira-se livremente na peça ateia-existencialista O Diabo e o Bom Deus, de Jean-Paul Sartre, na literatura de cordel e em uma montagem cinematográfica moderna para compor o imaginário de Deus e o Diabo na Terra do Sol.

Ambientado no sertão nordestino, o filme apresenta a história de Manoel, um sertanejo que mata seu empregador, quando este tenta enganá-lo em seu pagamento. Tornando-se um fora-da-lei, ele e sua mulher, Rosa, fogem e começam a seguir o bando de fanáticos liderados pelo profeta negro São Sebastião e, depois, o cangaceiro Corisco que lutavam contra os grandes latifundiários da região. Esses, porém, contratam Antônio das Mortes, o matador de cangaceiros, que vai em busca de Manoel, de Rosa e dos integrantes dos grupos rebeldes.

Alicerçado nos parâmetros da estética do ‘Cinema Novo’, o filme também remete a um tipo de faroeste, ou no caso um nordestern, pela situação narrativa que sustenta a trama, mas que se amplia pelas dimensões culturais que envolvem a obra, a sua época de produção e a perspectiva contestatória que invoca.

Assistir ao filme com o distanciamento histórico é ter certo privilégio de poder reconhecer a marca que ele fixou na história do cinema brasileiro e que merece ser visto com esse potencial icônico que adquiriu ao longo desse tempo. Se hoje, ainda temos um cinema brasileiro é porque existem pessoas que lutam e que acreditam no potencial da arte como transformação social e cidadã”.

Alexandre Maccari Ferreira

@cinemacc 

Servidor Público Federal

Doutorando em Comunicação pela UFSM.

 

Imagens: Divulgação e arquivos pessoais
Edição: Fritz R. Nunes (Sedufsm)

 

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