Trajetória de Sérgio Pires é referenciada e familiares recebem homenagens na UFSM SVG: calendario Publicada em
SVG: atualizacao Atualizada em 19/11/22 13h01m
SVG: views 666 Visualizações

Na sexta, 11, universidade inaugurou o Mês da Consciência Negra, que este ano tem Sérgio Pires como patrono

Alt da imagem

Uma vez eu perguntei: “Bah, pai, tu é bom demais, pra quê? Fica às vezes querendo conversar com gente que não quer olhar pra tua cara”. E aí ele disse: “Eu faço isso porque quero que vocês tenham um mundo melhor, que vocês não precisem se sacrificar tanto”. O diálogo é resgatado pela filha de Sérgio Pires, Adriane Pires, em vídeo produzido pela Assessoria de Imprensa da Sedufsm para homenagear o docente escolhido como patrono do Mês da Consciência Negra na UFSM em 2022.

Ao relembrar a interação acima, Adriane pondera que o pai estava certo: “Acho que a gente tem [um mundo melhor], sabe, acho que melhorou um pouco [...] Acho que encontrei muita gente boa como meu pai na minha vida. A gente tem que fazer a corrente do bem falar, do bem entender, do bem discutir política [...] A gente forma e educa as pessoas com as quais a gente convive. Essa é a importância da homenagem a uma pessoa como meu pai”.

Integrantes da família de Sérgio Pires, a exemplo de Cecília Pires (viúva de Sérgio) e de Carlos Alberto Pires (irmão de Sérgio), estiveram no Centro de Convenções da UFSM na última sexta-feira, 11 de novembro, para receber as homenagens da universidade a seu pai.

Sérgio Pires, que hoje dá nome a um auditório da instituição (pertencente ao prédio 17), faleceu na década de 1990, tendo sido, por muito tempo, um dos únicos docentes negros da UFSM. Envolvido com as lutas sociais, o movimento negro e a estruturação de um sindicato docente (posteriormente batizado de Sedufsm), ele é um dos grandes expoentes quando o assunto é militância política de esquerda na região central do estado do Rio Grande do Sul.

Tamanha importância foi destacada no evento da sexta à noite, que abriu o Mês da Consciência Negra na instituição. Para o coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (NEABI) da UFSM, Anderson Santos, as atividades desenvolvidas pelo Núcleo, em parceria com coletivos e organizações ligadas à causa negra e indígena, têm mantido aceso o legado de Sérgio na instituição e na sociedade.

“Sergio Pires, oriundo de Santiago, desde sua juventude lutou por uma sociedade mais justa e igualitária. Tornou-se um dos primeiros professores negros dessa instituição. Atuou em defesa de um projeto de universidade e sociedade democráticas, contra o autoritarismo da ditadura civil-militar. É uma representatividade muito importante por sua liderança e força. Foi candidato a vice-reitor da Ufsm e coordenador de uma luta fundamental, a da estatuinte universitária, deixando uma contribuição fundamental para o movimento sindical e os movimentos sociais. Como negros e negras, sempre consideramos que nossa existência advém da existência daqueles que vieram antes de nós. Sérgio Pires veio antes de nós. E hoje reafirmamos seu legado”, disse Santos, que é professor do departamento de Geociências da UFSM.

Ex-esposa de Sérgio Pires, Cecília Pires, e a filha Fabiana Pires recebem homenagem do presidente do Observatório de Direitos Humanos da UFSM, Victor de Carli

Uma vida voltada à justiça social

Ao receber a homenagem das mãos de Victor de Carli Lopes, coordenador do Observatório de Direitos Humanos da UFSM, Cecília Pires, viúva de Sérgio, lembrou a época em que ambos militavam no movimento estudantil durante os anos 60 e tentavam, por meio de estudos e de experiências práticas, compreender a sociedade e o conceito de justiça social.

“Conheci o Sérgio em Santiago, na juventude. Já naquela época trocávamos ideias acerca da justiça social. A avó paterna do Sérgio tinha sido empregada na fazenda de meu pai. E o pai do Sérgio viveu nessa fazenda, aos abrigos de meu pai. Era uma sociedade ainda com sinais de escravismo colonial. Quando começamos a namorar, ouvi críticas por estar namorando o neto de uma antiga empregada de nosso pai. Isso era fruto de preconceito e mentalidades atrasadas. Sérgio enfrentou muitas situações de racismo ao longo da vida, até mesmo quando professor universitário. Nunca permitiu, porém, que tais situações se tornassem empecilho para seus projetos de libertação e enfrentamento dos preconceitos. Nessa noite de celebração, agradecemos com muita emoção a homenagem realizada, reiterando a luta contínua em defesa dos direitos humanos e da vida”, disse Cecília.

Se a universidade já foi palco de discriminações contra Sérgio Pires e, até hoje, nela ainda se observam atos de racismo – como, de tempos em tempos, pichações em banheiros ou postagens em redes sociais -, é em muito porque o modelo de universidade ainda se baseia no eurocentrismo, na branquitude e nas estruturas racistas de poder.

Anderson Santos, que, à época da aprovação pela UFSM da primeira resolução que implementou ações afirmativas de ingresso para a população negra e indígena, em 2007, era um estudante, hoje, ao voltar à instituição como docente coordenador do NEABI, ressalta que a luta também é para que tenhamos mais professores e professoras negros e indígenas, bem como servidores técnico-administrativos em educação.

*Anderson Santos, coordenador do NEABI UFSM

“Lutamos em defesa da Ufsm, mas também por uma outra Ufsm, que seja popular. Quando pintarmos essa universidade com a cara dos nossos povos é que estaremos construindo efetivamente um espaço democrático. O NEABI é um espaço de aquilombamento, de luta e reivindicações. Estamos aqui para tensionar as estruturas da universidade, porque o espaço da universidade é marcado por uma forma de pensamento eurocêntrica, patriarcal, heteronormativa. Nós, como sujeitos negros e negras, lutamos e combatemos essas estruturas”, afirma Santos.

Desde 2021, estudantes, docentes, TAEs e movimentos sociais têm atuado na reestruturação do NEABI, que hoje se configura como um programa de ensino, pesquisa e extensão, coordenando projetos, concursos literários e inclusive uma obra do Núcleo, que deve ser intitulada “NEABI: saberes negros e indígenas”. “Temos um horizonte maior que está no nosso plano de ação previsto para 2023 e 2024, onde nossa grande pauta será o aprofundamento das políticas de ações afirmativas nesta universidade”, complementa o coordenador do Núcleo.

Educação étnico-racial nos currículos

Presente à solenidade da sexta-feira, a vice-reitora da UFSM, Martha Adaime, comentou sobre a necessidade de inserção das temáticas afro-indígenas nos currículos da instituição.

“Somos um retrato da sociedade, então muitas coisas que acontecem lá acontecem aqui na universidade. Mas como instituição federal de ensino, precisamos mudar. É com muita alegria que falamos que temos há um ano a Política de Gênero da Ufsm. A Política de Igualdade Racial precisa ser construída. Precisamos de engajamento e de vontade de fazer. Sempre tivemos dificuldade de inserir essas questões étnico-raciais nos currículos das Instituições. Mas essas questões de direitos humanos e em especial questões étnico-raciais precisam estar em todos os currículos da nossa instituição, para que dela derrame, transborde e consigamos atingir as escolas. Queremos um futuro, mas não podemos construir um futuro se não conhecermos e respeitarmos o nosso passado”, disse a gestora.

Já Isadora Bispo, integrante do Movimento Negro Unificado de Santa Maria (MNU) e da Comissão de Igualdade Racial da OAB, reforça a importância de resgatar a história do povo negro e de formular políticas públicas de saúde, cultura, educação e segurança voltadas à população negra.

“O MNU é um movimento político e quer interferir nas estruturas da sociedade, que sabemos serem racistas. A consciência negra não é para os negros. A consciência negra é para os não negros entenderem a participação da população negra na estruturação desse país. Ainda vejo pessoas falando de ‘consciência humana’. Que humanidade é essa que está matando gente no mercado pela cor da sua pele? Que está dando tiro de fuzil pela escolha religiosa? Temos de falar de consciência negra sim. Isso não é só no mês de novembro, é o ano inteiro”, diz Isadora.

Também estiveram presentes, na abertura do Mês da Consciência Negra, o prefeito Jorge Pozzobom e a secretária de Cultura Rose Carneiro; o Museu 13 de Maio, na figura do professor Getulio Lemos; o mandato da vereadora Luci Duartes; o presidente da Câmara de Vereadores Valdir Oliveira; o mandato do deputado Valdeci Oliveira, representado por Rogério Rosado, que também representou a União das Associações Comunitárias (UAC); e Moacir Barreto, vice-presidente da Estação Primeira de Mangueira.

Gustavo Rocha, o Afroguga, lembrou que o 15 de novembro foi instituído como “Nei Day” em Santa Maria, em referência ao militante negro e lgbtqia+ Nei D’Ogum, falecido em 2017. Antes de Sérgio Pires, o Mês da Consciência Negra na UFSM já homenageou nomes como Sandra de Deus, Maria Rita Py Dutra, Flávio Balaque, Geane Vargas, dentre outros e outras.

Na sexta-feira, a solenidade foi encerrada com o show da Escola de Samba Vila Brasil. 

A UFSM tem uma programação que se estende por todo o mês de novembro, em referência ao Mês da Consciência. Saiba mais aqui.

*Show da Escola de Samba Vila Brasil encerrou o evento da sexta-feira

 

Texto e fotos: Bruna Homrich

Assessoria de Imprensa da Sedufsm

 

SVG: camera Galeria de fotos na notícia

Carregando...

SVG: jornal Notícias Relacionadas

Seção Sindical não terá atendimento ao público na manhã de segunda-feira

SVG: calendario 18/04/2024
SVG: tag Sedufsm
Equipe funcional estará dando suporte à assembleia docente no campus sede, em Camobi

Sindicato promove seminário “Universidade que queremos” na quinta, 25 de abril, às 19h

SVG: calendario 17/04/2024
SVG: tag Sedufsm
Evento acontece no Auditório Flávio Schneider e terá a presença da professora Wrana Panizzi e do professor Renato Dagnino

Sedufsm detalha estado de greve à Reitoria

SVG: calendario 17/04/2024
SVG: tag Sedufsm
Audiência com reitor Luciano Schuch e com a vice, Martha Adaime, ocorreu na manhã desta terça, 16 de abril

Veja todas as notícias