Lobato e Cervantes revisitados em peça teatral
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24/04/13 17h33m
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Cultura da Sedufsm apresentou ‘As aventuras de Emilia e Dom Quixote'
Acostumado a receber debatedores que instigam uma discussão em torno de temáticas mais conjunturais, o auditório da Sedufsm cedeu lugar, durante a noite desta segunda-feira, 22, a um palco de teatro que, apesar de pequeno, pareceu ter dimensões incomensuráveis. Monteiro Lobato e Miguel de Cervantes foram reavivados através de seus personagens mais expressivos: Dom Quixote, Sancho Pança e a boneca de pano, atrapalhada e curiosa, Emilia.
A peça brincou com a imaginação das cerca de duas dezenas de crianças, de idades diferenciadas, que se acomodavam em colchonetes na frente do palco ou no colo dos pais. Esses, inclusive, também se deixaram levar pela interpretação viva e divertida de Ricardo Paim (Dom Quixote), Patricia Garcia (Emilia) e Bernardo Varone (Sancho Pança), todos bastante verossímeis com os personagens retratados nas obras.
O ‘Dia da Literatura Infantil’ e o ‘Dia do Livro’ – comemorados nos dias 18 e 23 de abril, respectivamente – foram o pretexto para que o sindicato lançasse um desafio aos atores, propondo-os a junção da obra ‘Dom Quixote’ à personagem do ‘Sítio do Pica-Pau Amarelo’, eternizada no papel de Emilia.
“Quem quer pegar Frestón?”, pergunta Dom Quixote, ao que quase todas as crianças levantam-se e erguem os braços, numa demonstração clara de estarem envolvidas pelo cavaleiro alucinado, que via gigantes em moinhos, imperadores em ovelhas e, com a valentia própria dos lunáticos, empunhava a espada contra um grupo de galinhas.
“Nosso objetivo sempre foi devolver cultura à comunidade”, diz o presidente da Sedufsm e diretor do ANDES-SN, Rondon de Castro, explicando que, apesar do formato diferenciado que a 56ª edição do projeto Cultura da Sedufsm trouxe, o propósito do sindicato seguiu preservado. “É uma atividade política também, pegando dois personagens de dois autores conhecidos pela intervenção política no meio cultural”, complementou Rondon.
Diorge Alceno Konrad, ex-presidente da seção sindical e docente do departamento de História da UFSM, também saudou a plataforma escolhida – o teatro – pois integrou pais e filhos, captando, em sua opinião, um dos melhores momentos que o projeto já proporcionou. “Vida longa ao Cultura na Sedufsm”, desejou o docente.
Se mexer no imaginário do público presente foi a investida principal do grupo ‘Companhia Armazém’, o questionamento do que se entende por loucura também se fez salutar nos quase 60 minutos de duração da peça. “Afinal, o que é loucura? Será mesmo que Dom Quixote era louco? Ou apenas um sonhador? E hoje, as crianças não querem ser heróis? Pois naquele tempo, ser herói era ser cavaleiro”, diz, após a peça, Patricia, ainda travestida de boneca de pano e sem perder todo o espírito arteiro do brinquedo que ganhou vida.
Após ouvir as aventuras que o cavaleiro e seu fiel escudeiro – Sancho Pança, um tipo guloso a quem a realidade aparecia tal como é, ao contrário das ilusões inventadas pelo velho - contam, Emilia diz: ‘Quero ser doida como D. Quixote’, e com isso, além de afagar o personagem de Cervantes, incentiva a desconstrução do conceito de loucura. Por que, se afinal, a realidade muitas vezes parece ficcional, quem são, de fato, os deslocados?
Com o auditório já vazio, os artistas desmontam o cenário, trocam-se – embora vestígios de personagens longínquos ainda insistam em permanecer sob a pele ou cabelos – e o auditório do sindicato, à retirada da cortina que compunha o plano de fundo da peça, volta a tomar sua forma. Aos que estavam presentes, o mais provável é que, se pareciam existir limites que separavam o movimento sindical das formas de expressão da arte, esses foram borrados.
Texto: Bruna Homrich (estagiária)
Fotos: Renato Seerig
Edição: Fritz Nunes (Jornalista da Sedufsm)