Made in China
Publicada em
22/10/2025
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Nestes anos como docente e pesquisador de Economia Internacional, sempre tenho procurado transmitir a meus orientandos e alunos que, no comércio mundial, não existem anjos e demônios, bons e maus samaritanos, mas sim interesses, como diria o saudoso ex-governador Leonel Brizola. O exemplo que uso geralmente é o apoio de Getúlio Vargas aos aliados na Segunda Guerra Mundial, visto que tal governo tinha várias simetrias com as potências do Eixo.
As leis trabalhistas tiveram como inspiração a Carta del Lavoro, de Mussolini; a Constituição de 1937, que balizou o Estado Novo, centralizando o poder, extinguindo direitos e dando poderes ao chefe do Executivo, foi baseada na Constituição autoritária da Polônia. Contudo, Vargas, contrariando a lógica e o senso comum, apoiou os aliados não por ideologia ou simpatia, mas por pragmatismo econômico, ou seja, o governo brasileiro precisava de financiamento para avançar com o Processo de Substituição de Importações (PSI) e conseguiu os empréstimos necessários para a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda, em troca do apoio logístico e operacional.
Feito este preâmbulo, é importante ressaltar a postura que o governo brasileiro terá frente às tarifas impostas por Donald Trump, as quais têm um aspecto nefasto por incidirem sobre a soberania e as decisões do Judiciário brasileiro. Com a aplicação dessas tarifas, observa-se a aplicação de conceitos básicos de Teoria Macroeconômica, explicados logo nos primeiros semestres de um curso de Ciências Econômicas, ou seja, para a economia americana, aumento dos preços, da inflação e queda nos níveis de bem-estar, bem como o aumento da recessão e do desemprego. Para o Brasil, os resultados são quedas das exportações para a economia americana e a busca de novos mercados e parceiros econômicos.
É neste contexto que entra, mais uma vez, a importância da China, que, conforme dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), é o principal parceiro econômico do Brasil, sendo o destino de aproximadamente 30% das exportações brasileiras, o que somou mais de US$ 84 bilhões em 2024, com destaque para soja, minério, carne e petróleo, dentre outras commodities.
Em função das restrições americanas, o Brasil deve aumentar suas relações comerciais com a China, bem como buscar novos mercados consumidores para seus produtos, possivelmente a União Europeia, o Mercosul e os países africanos, visando, com isso, manter o nível de emprego, os níveis de bem-estar e as exportações. Ou seja, a política americana contribuiu para aproximar o Brasil e o gigante asiático, o que poderá avançar para áreas de pesquisa e desenvolvimento, com impacto nos setores de média e alta intensidade tecnológica, e contribuir para a reversão do processo de desindustrialização prematura da economia brasileira, o que condena o país a ser um eterno exportador de commodities, sem condições de ter um projeto de nação com ênfase no desenvolvimento econômico e social.
Enfim, o que a sociedade está observando é que, no comércio mundial, o que move as nações são suas dotações orçamentárias, sua estrutura produtiva, a capacidade de atender sua demanda, dentre outros aspectos macroeconômicos. Ou seja, a ideologia fica em segundo plano, e os que esperavam ver o Brasil se afastando da China terão que, cada vez mais, observar nas prateleiras de mercados e lojas produtos Made in China, em boa parte graças às políticas de Mr. Donald Trump e seus próceres republicanos, defensores da moral, da família e dos bons costumes.
Sobre o(a) autor(a)
Professor do departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSM