Pesquisa mostra políticos entre grandes latifundiários
Publicada em
06/11/12
Atualizada em
06/11/12 12h08m
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Para docente da UFSM, conflito agrário vem do período colonial

Três anos de pesquisa, realizada pelo jornalista Alceu Luís Castilho, levaram à conclusão de que políticos brasileiros, filiados aos mais diversos partidos políticos – sobressaindo-se, entretanto, PMDB, PSDB e PR – são os maiores proprietários de terras do país. Após análise de aproximadamente 13 mil declarações de bens enviadas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por políticos eleitos, constatou-se que 2 milhões de hectares de terras estão concentrados nas mãos de políticos com mandatos municipais, estaduais ou federais. Esse valor, entretanto, pode ser maior, talvez alcançando os 4 milhões de hectares, uma vez que as informações passadas ao TSE são relativas apenas ao valor do terreno, e não à sua área total. O estudo encontra-se compilado no livro “Partido da terra: como os políticos conquistam o território brasileiro”. A obra é da editora Contexto, possui 240 páginas e custa aproximadamente 25 reais.
Questionados pela Sedufsm sobre as problemáticas que permeiam essa realidade, os docentes do departamento de Extensão Rural da UFSM, Paulo Roberto Silveira, e do departamento de Direito, Luiz Ernani Bonesso de Araújo, explicam que reside em relação a este assunto, um profundo conflito de interesses.
Paulo Silveira explica que, apesar de apresentarem um peso crescente nas decisões nacionais, os grandes grupos empresariais do setor agroalimentar não retiraram o poder político dos proprietários de terras, que agora estariam travestidos de empresários modernos ou produtores do agronegócio. “Tal poder é exercido para conter as reivindicações pela reforma agrária e para manter um modelo que sustenta a expansão econômica do país através da exportação de commodities agrícolas e agroindustriais. Os governos Lula e Dilma mantiveram nosso crescimento econômico baseado neste modelo agrário-agroindustrial-exportador, pois esse permite os superávits da balança comercial brasileira”, diz Silveira.
O professor Luiz Ernani Araújo diz que, para garantir a defesa de seus interesses, os proprietários rurais criam suas representações políticas, pois hoje, as decisões estão no Congresso e no Executivo. Para ele, essas representações visam não somente evitar a reforma agrária, mas toda e qualquer medida que se possa tomar em defesa da pequena propriedade e dos trabalhadores rurais. “No novo código florestal, por exemplo, a bancada ruralista se organizou para evitar que saísse uma legislação contrária a seus interesses. A questão ambiental fica de lado, porque o que importa é o lucro”, complementa Araújo.
Motivações
Um dos fatores que explica o raciocínio dos grandes políticos latifundiários é o que pressupõe ser mais difícil competir com países industrializados do norte na chamada tecnologia de ponta. Paulo Silveira esclarece que, dentro desse contexto, a representação da bancada ruralista no Congresso é a expressão do poder político dos que defendem o modelo de produção que associa concentração fundiária e produção em larga escala de commodities.
O docente ainda frisa os inúmeros aspectos negativos que decorrem desse modelo de desenvolvimento. “Esta agricultura ocupa pouca mão-de-obra, pois apresenta produtividade do trabalho crescente, e se utiliza do uso intensivo de agroquímicos, prejudiciais à saúde da população rural e à qualidade dos alimentos. Finalmente, deve-se concluir que tal poder político faz com que o governo federal iniba sua ação em relação à reforma agrária e que, através do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, aplique três vezes mais recursos no setor do agronegócio do que na agricultura familiar”, conclui.
Questão histórica
Ambos os professores explicam que o conflito sobre a terra data dos primórdios da colonização brasileira, quando, como pagamento de serviços prestados à coroa portuguesa, a nobreza de Portugal recebia capitanias hereditárias e sesmarias, o que privilegiou o acesso a terra por parte dessa nobreza.
Em 1850, define-se, no país, a Lei de Terras, e, a partir de então, só é permitido o acesso à terra perante compra, excluindo-se, assim, pobres e ex-escravos. “Deste modo, sempre se protegeu a propriedade da terra na mão de poucos, resultando na distribuição fundiária altamente concentrada até os dias de hoje. A ação política dos donos de terras, desde o império, tem garantido sua força para que mudanças significativas não ocorram no campo”, lembrou o professor Paulo Silveira, que exemplificou com a questão dos movimentos camponeses, encampados no início da década de 1960, e que pressionavam pela realização de uma reforma agrária radical, inserida nas reformas de base propostas pelo então presidente João Goulart. Temerosos, os grandes proprietários de terras não hesitaram em se aliar aos militares e aos interesses norte-americanos, que visavam o não avanço do socialismo no Brasil. Patrocinaram, então, o golpe militar de 1964.
“Para o regime militar, a modernização da agricultura deveria ser (e efetivamente foi) realizada sem desconcentrar a propriedade da terra, pois se tratava de modernizar o latifúndio, tornando-o espaço produtivo, coerente com a função exportadora da agricultura. Essa concepção tinha como princípio norteador a necessidade de desenvolver uma agricultura de larga escala, a qual utilizasse todos os insumos químicos, mecânicos e biológicos colocados à disposição pelos grandes grupos industriais multinacionais”, afirma Paulo Silveira.
Texto: Bruna Homrich (estagiária) com informações de UOL
Foto: Brasil de Fato
Edição: Fritz Nunes (Jornalista)
Assessoria de Imprensa da Sedufsm
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