Allende e a 'via pacífica' do socialismo chileno SVG: calendario Publicada em 11/09/13
SVG: atualizacao Atualizada em 11/09/13 15h49m
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Historiador da UFSM destaca experiência do Chile, 40 anos após o Golpe

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O presidente chileno, Salvador Allende, que foi deposto e morto por militares em 11 de setembro de 1973

Há exatos 40 anos, no Chile, o governo calcado num projeto popular que previa reformas e avanços para os direitos dos trabalhadores chegou ao fim. Salvador Allende, presidente eleito com pouca margem de diferença nos votos, era o candidato da Unidade Popular, articulação formada por vários grupos e partidos localizados à esquerda. Neste 11 de setembro, o professor do departamento de História da Ufsm e ex-presidente da Sedufsm, Diorge Konrad, avalia alguns aspectos do governo de Allende, que durou três anos – 1970 a 1973 – até que um golpe arquitetado pela Marinha e Força Aérea chilenas – apoiado pelos EUA e pela CIA (Central Intelligence Agency) – bombardeou o palácio presidencial, assassinando Allende e instaurando a ditadura de Pinochet.

O professor avalia tanto os aspectos positivos do período em que a Unidade Popular esteve à frente do país quanto os equívocos cometidos e os limites impostos. Para ele, ao mesmo tempo em que realizou reformas sociais e econômicas graduais – elevando a renda dos trabalhadores e fazendo avançar a reforma agrária, por exemplo -, o governo de Allende subestimou o papel reacionário das classes dominantes chilenas. “No lugar do socialismo, os chilenos tiveram pela frente a barbárie da reação capitalista e burguesa, através de uma Ditadura de Segurança Nacional marcada pelo terrorismo de Estado e que levou a um número de mortos e desaparecidos, durante todo o governo Pinochet, em torno de cinquenta mil pessoas”, pondera o docente.

Acompanhe a seguir a entrevista concedida à assessoria de imprensa da Sedufsm:

P - O que representou para a América do Sul um governo de orientação socialista, eleito pelo voto, como o de Salvador Allende?

R - Como todas as experiências socialistas do século XX, o caso chileno e o governo de Allende representou a infância da luta pelo socialismo na História. Depois da Revolução Cubana, em 1959, e a orientação socialista na ilha caribenha, a partir do início dos anos 1960, a opção chilena pelo socialismo, com e a eleição de Salvador Allende, em 1970, através da Unidade Popular, que era apoiada por comunistas, socialistas, setores liberais e católicos do Partido Social Democrata e do Partido Radical, além do Movimento de Ação Popular Unificada (MAPU) e da Esquerda Cristã, e tinha um grande apoio de movimentos sociais organizados e de trabalhadores urbanos e camponeses, inicia-se a abertura para o caminho ao socialismo do Chile. A grande novidade histórica do Chile de Allende foi a opção de via pacífica ao socialismo, oriunda de um processo eleitoral, rompendo com paradigmas de setores da esquerda, sobretudo a marxista, que hegemonicamente defendia, desde o século XIX, a estratégia revolucionária do “assalto ao poder” para a construção de um governo de caráter socialista.

P - Que tipo de influência o golpe militar contra Allende exerceu na América, e especialmente no Brasil, que já vivia uma ditadura?

R - O Golpe contra Allende consolidou a opção militarista de capitalismo inaugurada no Brasil, em 1964. Na renovação da divisão internacional do trabalho, aprofundada com a chamada “Guerra Fria”, a América Latina não poderia ter outro exemplo seguidor de Cuba. Por isto, o Golpe contra o Governo João Goulart e suas propostas de Reformas de Base foi um movimento avant garde para evitar o avanço de qualquer proposta que colocasse em xeque o capitalismo na região. As medidas socialistas do governo Allende, naquela conjuntura, seriam intoleráveis para os Estados Unidos, bem como do seu Departamento de Estado e da CIA, repetindo o que já haviam feito no Brasil quase dez anos antes, isto é, foram articuladores e protagonistas diretos do Golpe de Estado no Chile. A consequência direta foi mais para os brasileiros exilados de sua Ditadura, os quais viviam no Chile. O período mais intenso do terrorismo de Estado da Ditadura Brasileira se deu no Governo Médici, justamente quando, no mesmo período, se deu o governo de Allende e o Golpe liderado por Pinochet. O Chile de Allende e o apoio explícito do Presidente era um lugar mais seguro para nossos exilados, tanto que Márcio Moreira Alves, deputado brasileiro pelo MDB e bode expiatório para a criação do AI-5, em 13 de dezembro de 1968, foi um dos primeiros a ir para o Chile, ainda no final daquele ano. No Chile, nossos exilados se organizaram na Associação Chileno-Brasileira de Solidariedade (ACBS), na Unidade de Trabalhos Voluntários, na Frente Brasileira de Informações (FBI) e no Comitê de Denúncia à Repressão no Brasil (CDR). Com o Golpe, os cerca de cinco mil exilados brasileiros passaram a ser duramente perseguidos pela Ditadura Chilena.

P - Que diferenças ou similaridades se pode observar entre a ditadura militar chilena e a brasileira?

R - As duas ditaduras têm mais similaridades do que diferenças. No método e na repressão, ambas são ditaduras de segurança nacional e exerceram seu poder através do terrorismo de Estado, bem como não foram apenas ditadura militares, mas ditaduras civil-militares e com caráter de classe burguês. O argumento de que no Chile houve mais assassinatos e desaparecimentos não se sustenta quando se trata de comparar os conteúdos das duas ditaduras, versão que também se apresenta em relação à Ditadura da Argentina, iniciada em 1976, o que retira qualquer possibilidade de chamara a Ditadura Brasileira de “Ditabranda”. Quanto às políticas econômicas, o favorecimento ao capital estrangeiro e a concentração de capital nos grandes grupos, tanto locais como internacionais, foi outra característica similar, com um dado histórico relevante: no Chile, governado por Pinochet, ocorreu o primeiro laboratório latino-americano do neoliberalismo.

P - Que lições podem ser extraídas do governo socialista de Allende?

R - As grandes lições positivas são as políticas sociais e estatais de caráter socialista, apoiadas por uma ampla base social e política. Isto resultou em um processo histórico de nacionalização e estatização da economia, especialmente no nervo econômico central, a indústria de cobre e a riqueza do subsolo, bem como da elevação da renda dos trabalhadores via política públicas populares, além de uma reforma agrária que feria o coração do latifúndio chileno, aliado histórico do imperialismo, especialmente o norte-americano. As reformas sociais e econômicas graduais, no interior da democracia e da institucionalidade burguesa, visavam destruir os elos econômicos e políticos principais do capitalismo no Chile e abrir o caminho para o socialismo.

A negativa foi a subestimação do papel reacionário das classes dominantes chilenas, que ainda exerciam poder político e social na correlação de forças, assim como a crença no caráter legalista das Forças Armadas, tanto que, neste caso, Pinochet era de “confiança” do governo Allende, enquanto também era confiável aos grupos fascistas e de extrema direita que se articulavam na caserna. Estes grupos não foram isolados politicamente e foram os principais organizadores dos lockouts dos caminhoneiros e que levaram ao desabastecimento alimentar e outros boicotes contra o governo da Unidade Popular, como greves, pequenos levantes militares e atentados terroristas. Soma-se a isto a divisão da esquerda, sobretudo com a pressão do Movimiento de Izquierda Revolucionaria (MIR) para a ampliação imediata da radicalização socialista, o que levou a perda do apoio de setores sociais mais reformistas e pacíficos, situação grave, pois Allende já fora eleito sem ter uma maioria de apoio político.

Tudo isto levou a uma dialética entre reforma e revolução, para utilizar uma dialogia de Rosa Luxemburgo, que perdeu espaço na luta de classes do Chile de início dos anos 1970: no lugar do socialismo, enfim, os chilenos tiveram pela frente a barbárie da reação capitalista e burguesa, através de uma Ditadura de Segurança Nacional marcada pelo terrorismo de Estado e que levou a um número de mortos e desaparecidos, durante todo o governo Pinochet, em torno de cinquenta mil pessoas.

Texto: Bruna Homrich (estagiária)
Entrevista a Fritz R. Nunes (jornalista)
Assessoria de Imprensa da Sedufsm

 

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