MST lista 2013 como pior ano para a Reforma Agrária
Publicada em
08/01/14
Atualizada em
08/01/14 19h17m
739 Visualizações
Docentes opinam sobre a estrutura da política agrária do Brasil

Dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) realizaram balanço das políticas agrária e agrícola do governo federal do ano passado e concluíram que 2013 foi o pior ano para a Reforma Agrária. Segundo o MST, o mandato de Dilma vem retroagindo na desapropriação de imóveis, e até então 159 famílias em todo o país foram assentadas, o que na análise dos trabalhadores ‘Sem-Terra’ esse dado corresponde a um número muito baixo quando comparado com outros governos.
Para refletir sobre as questões atreladas à Reforma Agrária do Brasil, a Assessoria de Imprensa da Sedusfm traz a opinião do diretor do sindicato e professor da área do Direito Agrário da UFSM, Luiz Ernani Bonesso de Araújo e do professor do departamento de Extensão Rural da UFSM, Paulo Roberto Silveira.
Embora tendo uma gestão apoiada pelo MST, a administração petista pouco faz em termos de solucionar a crise das questões de uso e posse das terras. Para o professor Luiz Ernani, esse cenário “gera um paradoxo, pois se estariam alinhados politicamente, a situação deveria ser o inverso, ou seja, ações do poder público federal deveriam estar voltadas para solucionar o problema da terra no Brasil”, opina.
De acordo com o MST, a bancada ruralista é a maior frente parlamentar do Congresso Nacional. São 162 deputados e 11 senadores, e mais uma legião de adeptos de última hora. “Só para ter a dimensão do problema, por mais absurda que seja a pauta desse setor, eles conseguem sair vitoriosos em todas, mesmo em propostas inconstitucionais”, denuncia João Paulo Rodrigues, um dos coordenadores do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra.
O retrocesso da Reforma Agrária está atrelado, entre outros motes, com o agronegócio, atividade que concentra um grande capital e fortalece as relações da chamada ‘bancada ruralista’ com o governo de Dilma. Sobre esta aliança, o professor Paulo Roberto Silveira discorre que nos últimos anos, os governadores “vem ‘despotencializando’ a Reforma. De Lula pra cá diminui muito por ano, e isso tem uma lógica: um governo que não quer enfrentar os setores do campo, justamente pelo capital advindo do agronegócio”, enfatiza o docente.
Políticas públicas não atendem às necessidades dos movimentos sociais do campo
De acordo com o MST, o apoio ao latifúndio dificulta a criação de políticas públicas como aquelas relacionadas à agricultura camponesa e familiar, e impede que os modelos agrícolas sejam conciliados de forma satisfatória para ambos os setores. Do mesmo modo que inviabiliza também a demarcação de terras indígenas e quilombolas, o agronegócio se tornou um ‘vilão’ para os movimentos sociais que lutam pela terra.
Na análise de Ernani, é preciso entender que desde o Brasil colônia os dois modos de produção interagem: “um produz para exportação, outro para atender as necessidades de alimentação da população, mas as melhores políticas sempre estiveram com o primeiro. Há uma tentativa governamental de dar mais assistência a agricultura familiar, daí o surgimento do Ministério de Desenvolvimento Agrário, que se volta para esse setor. Desse modo, a possibilidade de conciliação existe, mas entendo que o modelo deve ser modificado, aproximando produtividade e questão social”, reflete o professor de Direito.
Comparando a estrutura do agronegócio com a agricultura familiar, Ernani explica que as políticas dirigidas para “o setor com características marcadamente empresariais são voltadas para o mercado exterior, onde o alto rendimento e o lucro se sobrepõe aos interesses sociais”. Enquanto que no outro modo de produção, “composto pela grande maioria da população rural distribuída em pequenas glebas rurais, as questões de produção estão interligadas com a questão social, daí a se falar em políticas públicas de apoio a agricultura familiar”, contextualiza o docente. Ele ainda completa que o Brasil adotou o modelo empresarial, o que acabou determinando “a formação de uma realidade social extremamente injusta que continuamente acentua a concentração de terras nas mão de poucos, ao mesmo tempo em que expulsa o homem do campo, criando um custo social enorme, pois este contingente populacional se instala nas periferias das cidades, sem ter qualquer perspectiva futura em termos de qualidade de vida”.
A crise social gerada pela saída do homem do campo também é reiterada pelo integrante do MST. “Nas duas últimas décadas mais de 6 milhões de pessoas foram expulsas pelo agronegócio no campo brasileiro. E foram para as favelas dos grandes centros urbanos. O agronegócio não gera emprego, mais de 70% da mão de obra empregada no campo é da agricultura familiar e se apropria das pequenas e médias propriedades, uma vez que a concentração de terras no Brasil segue aumentando ano a ano”, ressalta Rodrigues.
Já o professor da área de Extensão Rural da UFSM acredita que em virtude dos problemas ligados ao campo, a exemplo do ano passado, em 2014 haverá uma intensificação dos conflitos. “Pequenos agricultores, sem-terra, índios e quilombolas, os movimentos do campo em geral tendem a se organizar cada vez mais e vão se mobilizar, ainda mais em época de campanha eleitoral. Os ativistas irão travar uma luta muito intensa para tentar buscar espaços e lutar contra o favorecimento que o governo tem dado a bancada ruralista”, adianta Silveira.
Aplicação da Reforma Agrária
Quando se fala em ‘reformar’ a posse da terra entra em disputa a legislação e sua real aplicação. Ernani comenta que a Reforma Agrária está prevista tanto em termos constitucionais como da legislação ordinária, mas a sua aplicação é sempre uma questão política, sobretudo no Brasil, que desde a época colonial a terra já simbolizava poder, “daí a dificuldade de se resolver a injusta distribuição de terra que temos. Passam-se os anos e nada se resolve”, conclui.
O assentamento de famílias se tornou um ‘calo’ para o Executivo. O professor Silveira diz que “existe um diagnóstico que fica notório, um raciocino de que não querem assentar mais famílias e que o espaço agrário já estaria consolidado”.
Um novo olhar
Em fevereiro o MST vai realizar o seu 6° Congresso Nacional e nele, segundo Rodrigues, irá consolidar a proposta sobre a Reforma Agrária Popular. “Mais do que nunca a Reforma Agrária é urgente e necessária. No entanto, é uma Reforma Agrária de novo tipo, o que chamamos de Popular. Entendemos que a Reforma Agrária não é mais uma política voltada apenas para a população do campo. Ela é urgente e necessária para o conjunto da sociedade como um todo”, esclarece o representante do MST.
No ano passado, depois de analisar os resultados das ações do governo pela Reforma Agrária e a luta do MST, João Pedro Stédile, uma das lideranças do movimento, disse que aposta numa nova forma de luta para se conquistar a reforma. Para ele, essa nova luta têm de ser por território e precisa incluir novas bandeiras, como direitos indígenas, desmatamento, trabalho escravo e impactos da mineração.
Texto: Carina Carvalho (estagiária) com informações do MST
Foto: Google/Divulgação
Edição: Ana Paula Nogueira (Jornalista Interina)
Assessoria de Imprensa da Sedufsm
Galeria de fotos na notícia
